segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

COTISTAS DO RIO, incertezas à frente. * por Humberto Adami

A publicação  na data de hoje, 24.02.2014, do acordão dos Embargos de Declaração sobre o julgamento da ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 0026967-63.2012.8.19.0000, originária do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ajuizada pelo Deputado Flávio Bolsonaro contra a Lei 5.401/2012 que institui Cotas para negros e índios nos empregos públicos da Prefeitura do Rio, deu alento aos cotistas, mas não transformou sua vida num mar de rosas.  Nele escreveu o Desembargador MILTON FERNANDES DE SOUZA, relator do feito:

   "Por outro lado, assiste razão ao segundo recorrente, no que 
concerne à ausência de pronunciamento quanto à modulação dos efeitos da 
decisão proferida na ação direta de inconstitucionalidade, o que deve ser 
corrigido. 

 É bem verdade que a declaração de inconstitucionalidade 
demanda, em princípio, a atribuição de efeitos ex tunc. 

 Entretanto, a atribuição de tal efeito na hipótese sub examime 
poderia provocar um colapso na Administração Municipal, com aptidão de 
causar, consequentemente, prejuízos à população local, por força da súbita 
exclusão de candidatos nomeados e/ou já empossados em decorrência da 
aprovação em concursos públicos realizados sob os ditames da lei 
declarada inconstitucional, o que poderia gerar grave comprometimento do 
serviço público. 

 Neste aspecto, demonstrada a possibilidade de grave lesão à 
ordem pública e à segurança jurídica, prudente é atribuir-se efeitos 
prospectivos (ex nunc) à declaração de inconstitucionalidade, consoante 
permissivo legal (Lei 9868, art. 27), de molde a assegurar a validade dos 
provimentos dos cargos ou empregos oferecidos em concursos públicos já 
homologados. 

 Por outro lado, não se vislumbra óbice ou qualquer prejuízo 
no que tange à adequação das normas dos certames em andamento aos 
termos do aresto impugnado. 

 Em sendo assim, a declaração de inconstitucionalidade da Lei 
Municipal 5.401/12 deve surtir efeitos a partir da publicação do presente 
acordão, consolidando-se as nomeações e as posses dos candidatos 
aprovados em concursos públicos já concluídos, devendo a Municipalidade, 
contudo, adequar os editais dos certames em andamento ao que foi decidido 
na presente ação direta."

O Desembargador não admitiu a participação do IARA INSTITUTO DE ADVOCACIA RACIAL E AMBIENTAL, como amicus curiae, considerando de pouca utilidade, dado o avançado estágio do julgamento, já em sede de embargos declaratórios. 

Nada obstante, a decisão unânime do TJ RJ não deve minorar os prejuízos dos cotistas negros e índios totalmente. Primeiro, porque as filas de nomeação dos não cotistas não pararam em muitos concursos, sendo as vagas apesar de reservadas, as mesmas. Ou seja, a fila andou. Assim, um cotista que estava em vias de ser empossado, ainda o será, mas terá de ser conformar com as vagas restantes. Explicaram-me os cotistas que estiveram em meu escritório, que a classificação é importante para que consigam as vagas das unidades regionais que são próximas às suas residências. 

O prefeito do Rio de Janeiro publicou o decreto no. 38.285 que reserva a vaga dos cotistas até quando transitada em julgado a decisão do TJ RJ. 

Assim, no caso de recurso especial ou extraordinário, do autor da ação (que sim, pode recorrer), Deputado Flavio Bolsonaro, aos Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal, respectivamente, não existirá o "trânsito em julgado", que significa ausência de recurso, a discussão judicial vai levar bom tempo ainda. 

O prefeito do Rio, Eduardo Paes, remeteu, finalmente, o projeto de lei para cotas de negros e indios. A notícia pode ser vista em  http://oglobo.globo.com/blogs/blog_gente_boa/posts/2014/02/17/paes-apresenta-projeto-de-cotas-para-negros-indios-em-concursos-524737.asp. A foto escolhida para ilustrar a ocasisão mostra a falta de boa vontade para com o tema. Ademais, o projeto tomou o numero de 666/2014, que provocou risadas entre os cotistas reunidos no escritório.  

Muitos deles discutiram a semana toda para saber se a publicação da decisão dispensa qualquer medida judicial unilateral, ou, se ainda assim, faz-se necessário uma intervenção.  Tenho recomendado o ajuizamento de medidas que visem garantir a posse, bem como a localização na classificação e localidade. Ou ainda exigir a publicação da lista de aprovados com cotistas, já que, em alguns concursos, ocorreu a publicação do resultado do concurso, sem a relação de cotistas. Posses ocorreram nesse interregno, e a depender do decreto em vigor,  não pararão. As primeiras ações já foram distribuídas e aguarda-se o deferimento liminar que vai dar tranquilidade aos concorrentes cotistas, garantindo posse e lugar na fila, bem como prejuízos reparados, posteriormente, em ação própria.  

Assim, os cotistas que ficarem para depois, penso, receberão o que sobrar dessas vagas. Exemplo: alguém pede para  tomar posse numa unidade do Morro do Alemão, que tem 10 vagas, e quando finalmente empossado, aquela vaga que ele pretendia, e que tinha chance, já está ocupada por um não cotista, e ele somente poderá tomar posse na "vaga reservada",  na unidade de Campo Grande. Nada disso será discutido, senão em demandas individuais, além dos prejuízos materiais e morais. Não vejo, também, a retroatividade dessas nomeações, vez que os não cotistas, não fizerem nem leis, nem editais, assim como os cotistas.  

A notícia que recebi hoje de meus amigos de Cachoeira do Sul, Rio Grande do Sul, me faz exagerar positivamente nas medidas necessárias no momento. Lá os cotistas que já trabalhavam há ano e meio, foram demitidos após um TAC do Ministério Público do RS e da Prefeitura de Cachoeira do Sul. Também por vício de origem na elaboração da lei de cotas. Ver a aqui.  

Como Ouvidor da SEPPIR, procurei dar todo o apoio, inclusive provocando a Corregedoria do MP RS e CNMP Conselho Nacional de Ministério Público. Ontem recebi a cópia da sentença da ação indenizatória que os "19 afros" ajuizaram para receber o restabelecimento de seus sonhos e prejuízos, e que o juiz gaúcho Afonço Carlos Bierhals, assevera, em decisão monocrática, que nada lhes é devido, condenando-os em custas e honorários.  O processo é o 
006/1.10.0005579-8 (CNJ:.0055791-28.2010.8.21.0006), da 1a. Vara Cível de Cachoeira do Sul - RS

Assim, muitos problemas judiciais ainda teremos Brasil afora, e melhor tornar essa atitude um hábito. 

HUMBERTO ADAMI 
humbertoadami@gmail.com

Advogado e Mestre em Direito
Vice-Presidente da Comissão Nacional de Promoção da Igualdade do CFOAB - Conselho Federal da Ordem dos Advogados


Ver também:

Cotistas entram na Justiça para garantir direito à vaga em concurso da Prefeitura do Rio













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